A MITOLOGIA AFRICANA
A mitologia, tanto a européia como as de outras  tradições, aborda instintos humanos (como o poder  do amor, do ciúme, da ansiedade; o conflito de gerações;  a violência; a tristeza da doença e dos sinistros;  o mistério da morte; o desafio do desconhecido; os tempos  de má e boa fortuna e todo o peso do destino). Contos de  homens e deuses retratam os reveses e as alegrias da vida.
Nietzsche observou que os gregos ofereciam festas  a todas as suas paixões e inclinações; eles  consideravam como divino tudo que tem algum poder no homem; o cristianismo  jamais compreendeu esse mundo pagão e sempre o combateu e  o desprezou.
A mitologia européia é interpretada  hoje sem restrição. Mas há restrição  quando falamos em mitologia africana, certamente porque a relacionamos  com o culto aos orixás (candomblé e umbanda), ainda  vivo na África e no Brasil.
Devemos deixar de lado o aspecto religioso e conhecer  a beleza e a riqueza da cultura africana, na qual se inclui a sua  mitologia e sua arte. Os principais produtos artísticos africanos  são as máscaras e as esculturas em madeira, as quais,  para os membros da sociedade africana, constituíam objetos  sagrados com poderes sobrenaturais: acreditavam que poderiam atrair  a destruição ou distribuir bençãos.
As máscaras e as esculturas em madeira têm  forma angulosa, assimétrica e distorcida; uma forma não-realista,  obviamente para expressar, com efeito dramático, que os objetos  abrigam espíritos poderosos; nada de aparência real,  mas formas verticais e membros do corpo alongados.
Pablo Picasso conheceu, por volta de 1905, a arte  africana, a qual muito o atraiu, principalmente pela sua independência  da tradição européia. Disse Picasso sobre as  máscaras africanas: "Senti que eram muito importantes  ... As máscaras não eram apenas peças esculpidas  ... Eram magia".
A arte africana inspirou Picasso a criar o movimento  cubista, o qual recebeu a influência das distorções  do entalhe africano, destinadas a mostrar simultaneamente aspectos  múltiplos de um objeto. As técnicas cubistas expressam  intensas emoções e conflitos internos. O quadro Les  Demoiselles d'Avignon representa o ponto de transição  da fase de influência africana para o puro Cubismo; esse quadro  é uma obra de ruptura (encerrou o reinado de quase quinhentos  anos da Renascença), uma das poucas obras que, sozinha, alterou  o curso da arte; os cinco nus do referido quadro têm anotomia  indistinta, olhos tortos, orelhas deformadas e membros deslocados.
As máscaras não eram apenas peças  esculpidas ... Eram magia. Esse sentimento de magia, manifestado  por Picasso, nos lembra recente ensinamento de Desmond Morris, autor  de "O Macaco Nu", um dos maiores especialistas em comportamento  humano e fabricante de amuletos. A revista Superinteressante perguntou-lhe:  Não é contraditório que um cientista faça  esse tipo de jóias? Você crê no poder desses  objetos?
Respondeu Desmond: Claro que não. Mas creio  no poder de quem os leva. Está provado que se você  acredita que um objeto vai lhe ajudar e proteger, suas defesas crescem  e sua energia flui com mais harmonia. Tudo está em nosso  interior.
Na mitologia africana, há um deus supremo  (Olodumaré), o qual criou os orixás (deuses) para  governarem e supervisionarem o mundo. O orixá é uma  força pura e imaterial, a qual só se torna perceptível  aos seres humanos manifestando-se em um deles; o ser escolhido pelo  orixá, um de seus descendentes, é chamado seu elégùn,  o veículo que permite ao orixá voltar à terra  para saudar e receber as provas de respeito de seus descendentes  que o evocaram. Ainda inexiste um panteão de orixás  bem hierarquizado, único e idêntico.
Quais os principais deuses (ou orixás) ou  autoridades da mitologia africana ? Exu, Ogum, Oxóssi, Ossain,  Orunmilá, Oranian, Xangô, Iansã, Oxum, Obá,  Iemanjá, Oxumaé, Obaluaê, Nanã e Oxalá.  Africanos e não africanos têm em comum tendências  inatas e um comportamento geral que corresponde às características  de um orixá (arquétipos).
Exu é o guardião dos templos, das casas,  das cidades e das pessoas; serve de intermediário entre os  homens e os deuses (chamado de mensageiro, compadre ou homem da  rua); suas cores são o vermelho e o preto. Os missionários  compararam Exu com o Diabo, símbolo da maldade, porque Exu  é astucioso, grosseiro, vaidoso e indecente. Mas Exu possui  o seu lado bom; revela-se o mais humano dos orixás, justamente  porque não é completamente mau, nem completamente  bom. Exu é o arquétipo das pessoas com caráter  ambivalente (ao mesmo tempo boas e más), porém com  inclinação para a maldade, a obscenidade e a corrupção.

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